Enquanto a reforma política tem a urgência de ser aprovada até um ano antes da eleição de 7 de outubro de 2018 para entrar em vigor, o respeito ao limite salarial do funcionalismo público é ponto nevrálgico não só em função das contingências fiscais da União, dos estados e dos municípios, mas passo fundamental para uma efetiva moralização da República.
Sem dúvida, os agentes públicos eleitos pela população, assim como os partidos políticos, precisam retomar a conexão com a sociedade, deixar de lado interesses privados e escusos para colocar em primeiro plano o bem comum e coletivo. Por isso, é preciso rechaçar ideias como a destinação bilionária de recursos públicos para financiar campanhas eleitorais, dinheiro que deveria ser empregado em investimentos sociais, políticas de educação e saúde, transporte, segurança…
Mas não é só isso a panaceia dos problemas nacionais. Dinheirama de igual grandeza escoa mensalmente dos cofres públicos, nos três níveis de governo e nos três poderes, por meio de artimanhas e penduricalhos, criados por castas de juízes, desembargadores, promotores, procuradores, parlamentares, assessores legislativos, membros do executivo e outros, para engordar seus já polpudos salários. Auxílios das mais diversas naturezas não passam de subterfúgio para amealharem vencimentos que já superam, em cerca de 15 vezes, a média salarial dos brasileiros.
Num país em que o trabalhador comum recebe R$ 2,1 mil, ainda somos “brindados” por um juiz do Mato Grosso que não se contenta em ganhar no máximo R$ 33,8 mil, leva uma bolada de meio milhão de reais num único mês e diz que não está nem aí para a opinião pública! E o que é pior: muitos dos tribunais que promovem essa derrama de dinheiro dos contribuintes para uns poucos privilegiados nem sequer abrem suas planilhas ao escrutínio social. Oxalá a ordem do Conselho Nacional de Justiça para abertura dessas verdadeiras caixas-pretas seja enfim cumprida e os brasileiros possam calcular o peso e o custo dessas elites burocráticas.
Paralelamente, Executivo e Legislativo também devem prestar contas à sociedade e combater diuturnamente as brechas usadas para o pagamento de supersalários, aposentadorias e pensões desproporcionais à realidade brasileira. Propostas como a reforma da Previdência visam justamente tornar o sistema mais igualitário e sustentável, mas a grita corporativista mais uma vez age para bloquear os interesses nacionais. Da mesma forma, resistem a colocar em votação no Senado a PEC 63/2016, da qual fui autor, que acaba com todas as brechas na lei para fazer o teto do funcionalismo, nos três poderes, ser efetivamente cumprido.
Na ânsia de proteger seus privilégios, há quem veja as críticas aos supersalários como reação ou vingança de uma classe política acuada pelas investigações de condenáveis esquemas de corrupção e desvios. Nada mais falso. Ambas as situações, a seu modo, são entraves à transformação do Brasil em um país melhor para a população em geral, com menos pobreza e injustiça e mais oportunidades de emprego, inovação e crescimento.
Como se vê, a agenda de mudanças de que precisamos é extensa. Não será do dia para a noite, nem com soluções tiradas da cartola ou reducionismos típicos de redes sociais, que o estado brasileiro deixará de ser paternalista, submetido ao patrimonialismo e corroído pela ineficiência, pela corrupção e pelo corporativismo. Para sermos uma República não só de direito, mas principalmente de fato, precisamos unir as forças refratárias ao populismo maniqueísta e, juntos, dar os primeiros passos dessa longa caminhada.
José Aníbal é presidente nacional do Instituto Teotônio Vilela. Foi deputado federal e presidente nacional do PSDB.