Ciclo de Debates ITV: Regulamentação do trabalho deve estimular solução de conflitos dentro da empresa e não na Justiça
A Reforma Trabalhista deve estimular a solução dos conflitos entre empregados e empregadores dentro da empresa, com o objetivo de reduzir o número excessivo de casos na Justiça do Trabalho. Esta questão foi um dos destaques da palestra feita pelo economista Hélio Zylberstajn no segundo dia do ciclo de debates sobre as reformas estruturantes que vão dominar a pauta do Congresso Nacional ao longo deste ano. Professor da USP e presidente do Instituto Brasileiro de Relações do Trabalho (IBRET), Zylberstajn avalia que um passo importante nesta direção será a instituição de um representante dos trabalhadores para intermediar os conflitos que surgem diariamente nas empresas, conforme previsto na proposta apresentada pelo governo federal (PL 6787/2016).
“Com a figura do representante, estaremos criando um canal de diálogo dentro da empresa. é uma mudança de paradigma, que certamente irá diminuir bastante a importância da Justiça do Trabalho. Pode ser o início da grande transformação no tratamento das reclamações trabalhistas. Poderemos administrar o conflito no nascedouro”, explicou. Segundo dados apresentados por Zylberstajn, o número de reclamações trabalhistas na Justiça cresceu na mesma proporção que os empregos formais, saltando de 1,2 milhão de novas ações em 1990 para 2,8 milhões em 2016. “Pelas regras atuais, os conflitos só podem ser resolvidos na Justiça. As negociações são pensadas para fora da empresa. E fora, viram litígio”, completou.
A instituição do representante, destacou o economista, deve estar acompanhada da “prevalência do negociado”, outro dispositivo previsto no PL 6787/2016. Segundo o texto, convenções ou acordos coletivos terão força de lei quando dispuserem sobre jornada de trabalho, parcelamento da participação nos lucros, horas em trânsito, intervalos entre jornadas, ultratividade do instrumento coletivo, adesão ao programa de seguro-emprego, plano de cargos e salários, regulamentação empresarial, banco de horas, trabalho remoto, remuneração da produtividade e registro da jornada de trabalho.
“Minha sugestão para este ponto é que a prevalência se aplique apenas aos acordos coletivos e que haja um requisito de representatividade para que os sindicatos estejam aptos a intermediar os acordos”, disse Zilberstajn. Segundo ele, entre os trabalhadores interessados na convenção, pelo menos 50% mais um devem ser sócios do sindicato intermediador.
Terceirização e trabalho intermitente
O presidente do IBRET destacou que, além da proposta de reforma apresentada pelo governo, o Congresso Nacional precisa se debruçar sobre outros três itens: a terceirização, o trabalho intermitente e o Programa de Proteção ao Emprego (PPE). “Hoje o que regulamenta a terceirização é uma súmula do TST que permite a sua aplicação apenas para as atividades-fim da empresa. E esse conceito depende de interpretação judicial. Isso não faz sentido. As empresas deste século são horizontais. No mundo todo a terceirização é permitida para todas as atividades, sem diferenciação entre fim e meio”, afirmou Zylberstajn.
Neste sentido, sugeriu, os parlamentares deveriam se debruçar sobre o PLC 30/2015, aprovado pela Câmara e em tramitação no Senado. “Não podemos nos render ao falso discurso de que terceirizar significa precarização do emprego, porque os direitos dos trabalhadores serão mantidos”, afirmou. “O que os sindicatos fazem hoje é uma mentira. Comparam salários de terceirizados com funções mais baixas com salários de empregados via CLT que exercem funções mais complexas e que, por isso, ganham mais. Comparam banana com laranja”, acrescentou.
“O trabalho intermitente também precisa ser urgentemente regulamentado. Estamos falando de pessoas estão em feiras, atividades culturais, turísticas. São atividades de movimentação intensa e que precisam ser acomodadas na legislação”, disse Zylberstajn, sugerindo que seja adotado o texto do PL 218/2016, em tramitação no Senado.
Previdência
Zylberstajn destacou ainda que é preciso aproveitar a oportunidade da Reforma da Previdência para corrigir distorções no mercado de trabalho. é necessário, segundo ele, reduzir a oneração da folha, aperfeiçoar o seguro desemprego e criar uma poupança a longo prazo para a Previdência. “A PEC 287 é essencial. Mas seu efeito é limitado se não vier acompanhado dessas outras medidas”, concluiu.
A Reforma da Previdência será o tema do terceiro debate promovido pelo ITV e a Liderança do PSDB na Câmara, marcado para esta quinta-feira (09/02). Deputados e senadores vão debater a questão com o economista e pesquisador do IPEA, Paulo Tafner.
Falar também pelos desempregados
“O mundo mudou, mas a nossa legislação continua praticamente a mesma. Devemos ouvir segmentos organizados da nossa sociedade, mas também dar voz aquelas que estão desempregadas, mais de 12 milhoes, e aquelas que estão desenganadas e não procuram mais trabalho – 15 milhões. Essas 27 milhões de pessoas que poderiam estar integradas à sociedade estão à margem dela. Elas devem ser peças essenciais na formatação de uma modernização da legislação trabalhista”, destacou o deputado Rogério Marinho (PSDB-RN), relator da reforma trabalhista na Câmara.
Segundo ele, o projeto que o governo enviou ao Congresso e que será fruto de discussão na comissão especial aponta na direção correta, pois contempla, entre outros, a questão dos empregos em tempo de crise, o trabalho temporário e o banco de horas. Apesar disso, o tucano defende uma ampliação do escopo da matéria.
“A reforma é a oportunidade de modernizar uma legislação antiga e que não condiz com a realidade, pois foi consolidada nos anos 40, quando o Brasil ainda tinha a maior parte dos empregos no campo e estava caminhando para a industrialização”, disse o parlamentar. Hoje, como lembrou, a economia é voltada para os serviços e já entra em uma nova era, a digital.
“Podemos ampliar e discutirmos ainda outros pontos, como novas formas de contratação, relação da justiça do trabalho com as empresas e com o legislativo, a situação dos atuais desempregados que precisa ser contemplada, a necessidade de modernização dessa legislação diante da evolução do mercado com as novas formas de trabalho existentes hoje. Tudo isso deve ser levado em consideração durante a comissão especial”, adiantou Marinho.
Manutenção de direitos
O relator frisou a importância de contemplar trabalho intermitente, que permite ao trabalhador ter uma escala móvel, seja ela apenas nos finais de semana, à noite ou em alguns dias específicos da semana. Ele afirmou é que preciso garantir isso em lei, mas mantendo todos os direitos essenciais já consolidados como FGTS, 13º, férias e Previdência. “Isso vai combater a precariedade do trabalho, aumentar a formalidade e a quantidade de empregos”, apontou. O alerta para que as modificações na legislação não impliquem, de forma alguma, exclusão de direitos dos trabalhadores também foi reforçado pelos demais participantes do debate.
Outro ponto defendido por Marinho é a questão do tele trabalho ou trabalho remoto, modalidade na qual a pessoa é contratada pela empresa mas exerce suas funções em casa. Como ressalta, isso também necessita ser contemplado pela reforma por se tratar de algo que terá um grande crescimento nos próximos anos.
Necessidade de empregados e empregadores
O deputado Miguel Haddad (SP) conclui que a reforma trabalhista é necessária para trabalhadores e empresários. “Temos que criar condições para que o trabalhador possa ter acesso ao mercado de trabalho, bons salários, e para que o empresário se torne competitivo. A legislação em vigor é muito antiga, não se modernizou e, enquanto isso, tudo mudou, estamos caminhando para a era do conhecimento e se faz urgente que tenhamos leis modernas, atuais e que protejam e valorize o trabalhador ao mesmo tempo em que dê segurança ao empresário”, avalia. O tucano destacou a importância do seminário promovido pelo PSDB. Ao ouvir especialistas que trabalham há anos nas áreas em debate, o tucano afirma que os deputados ganham subsídios para ajudar na elaboração de propostas sólidas e que atinjam seus objetivos.
O líder do PSDB na Câmara, Ricardo Tripoli (SP), afirmou que os debates promovidos pelo partido dão aos parlamentares as condições de fazerem o enfrentamento necessário em defesa das reformas. Segundo ele, as discussões também são importantes para que os tucanos levarem as ideias defendidas pela legenda às suas bases eleitorais.