Nasci na barranca do rio Mamoré, um mar de água doce que separa o Brasil da Bolívia, na cidade de Guajará-Mirim, que tem no lado boliviano sua homônima, Guayaramerin. Alguns quilômetros depois de Guajará, o Mamoré recebe da Bolívia o rio Beni, que nasce nos Andes, formando o imenso rio Madeira, que segue até desembocar no Rio Amazonas. Entre Porto Velho e Manaus, ou Itacoatiara, o Madeira escoa parte da produção de grãos de Rondônia com comboios de at&ea cute; 20 barcaças, cada qual com 2 mil toneladas de carga.
No Madeira, antes de chegar a Porto Velho, foram construídas e inauguradas na década passada, duas usinas hidrelétricas: Jirau e Santo Antônio. As duas juntas têm potencial de produção de 7.000 MW de energia, equivalente a metade da produção de Itaipu, a maior hidrelétrica do Brasil.
Toda essa história para dizer do meu espanto ao ver nos jornais que a usina de Santo Antônio, quarta maior hidrelétrica, suspendeu suas operações porque o rio Madeira, com a seca, está com apenas 50% (metade) da média de sua vazão. A outra metade evaporou!
Na barranca do Mamoré, onde aprendi a nadar, jamais imaginei que uma seca de tal magnitude poderia ocorrer. E com a seca, como já podemos ver nos noticiários, rios da Amazônia estão desaparecendo nesses dias, com mortandade enorme de peixes, alimento fundamental na região e falta água potável na maior reserva de água doce do mundo! A população tem que andar quilômetros para conseguir 20 litros de água limpa.
As chuvas, esperadas pelos produtores de grãos em Mato Grosso, ainda não apareceram, retardando o plantio da soja. O transporte da safra de milho já está penalizado pelo porto de Miritituba, o mais importante escoadouro da região. Enfim, a “fúria” da natureza vai se mostrando implacável e, infelizmente, não apenas para quem a maltrata tão continuadamente: queimadas, envenenamento dos rios e desmatamento por garimpos criminosos, poluição sufocante.
O desafio é econômico, social, ambiental e, principalmente, de ações de prevenção, recuperação e construção de políticas públicas e privadas para impedir que está gravíssima realidade se agrave. Ao contrário, temos que recuperar e manter a Amazônia com toda a sua extraordinária biodiversidade. A responsabilidade é nossa, mas o mundo e especialmente os países desenvolvidos, têm que colaborar intensamente, sem nenhum risco a soberania nacional sobre a Amazônia. O que envolve também, o combate sem tréguas ao crime organizado, ao tráfico de drogas e a todas ações criminosas que infestam a região.
Os governos, na emergência, estão buscando agir para atenuar esse forte impacto ambiental na maior reserva florestal do planeta. É necessário fazer dos impulsos do momento uma ação permanente e eficiente. É também uma grande oportunidade para que o agronegócio se associe definitivamente a sustentabilidade em toda sua cadeia produtiva. Dar um basta ao reacionarismo que ainda está muito presente quando se trata de legalização fundiária, legislação ambiental e ampliação do cultivo em novas terras.
Olhar adiante, descortinar um futuro, quanto mais próximo melhor, em que o Madeira e todos os rios da Amazônia tenham, como já tiveram, permanentemente, a água necessária para a vida, a economia e a biodiversidade.